Como muit@s pensador@s
tem falado, aquilo que cotidianamente chamamos “sistema que nos oprime” ou
castiga, mora realmente dentro do nosso corpo, quer dizer, nossa mentalidade encarnou
e incorporou esse sistema através da educação e da vida cultural, e somos nós
mesm@s quem fazemos ele operar diariamente na nossa vida e na vida social.
O exemplo das mulheres
auto castigando seu corpo, é clássico dessa hospedagem perversa que fazemos
dentro de nós mesmas, um auto castigo operado por médio de uma percepção
negativa sobre o que somos. Nestes dias juntei vários exemplos do tema para
escrever esta nota, e gostaria hoje divididos com vocês:
Numero um. Fiz uma oficina
de dança com um renomeado mestre de afro aqui na Bahia, ao final da aula ele
perguntou como tinha sido a experiência. Duas dançarinas que eu sempre admirei
pela sua beleza física e artística, e que sempre achei maravilhosas dançando, falaram
uma coisa que me deixou surpreendida: “Nos
tínhamos medo de vir, pois não sabíamos se poderíamos fazer esta aula”. As melhores dançarinas que eu já vi, tem
medo de fazer algo novo?
Numero dois. No mesmo
evento, contratei uma estudante como colaboradora de pesquisa, quando falei
para ela quanto iria me cobrar para fazer seu trabalho, ela me respondeu: não me pague nada, eu faço isto com muito
amor. Até agora estou esperando ela me cobrar e
fazer valer seu tempo e esforço!.
Mais um exemplo, dei para
uma amiga um biquíni que comprei numa daquelas promoções que vendem peças com
costuras defeituosas, era muito lindo, porem, tinha alguma coisa que não funcionava
e se dobrava um pouco. Minha amiga usou bem contente o presente, mas, quando eu
sinalei para ela que tinha olhado onde ficava o defeito da peça, ela me diz, “é que eu sou muito baixinha, se eu fosse
mais alta, o biquíni ficaria melhor...” Eu tentei convencê-la que realmente a culpa era da peça não da sua
altura.
E o final, uma amiga
veio para me visitar aqui em Salvador, eu a levei para dar um passeio,
quando diz para ela que posso tirar umas fotos de lembrança, ela me diz: “estou
muito branca e gorda, não vou postar fotos assim no Face book”. Ao
final a convenci de tirar pelo menos uma fotinho, porem, ela me diz, “ta tudo bem, mas, que não apareçam minhas
pernas gordas e brancas, que vergonha”
Quando as mulheres contássemos
as vezes que no dia dizemos coisas duras, feias e pouco amistosas contra nossos
corpos e vidas, nos surpreenderíamos, pois são muitas!! Faça o exercício, conte
o numero de vezes que se auto castiga no dia. Faça o exercício de ver quantas
vezes você mesma reproduz “o sistema” que tanto critica. Agora, se a gente conta
todas as vezes no dia de todas as mulheres,
entenderiamos porque tantas continuam em
situações de clara discriminação.
Mas, também faça nesta
lua minguante que começa, o exercício de dizer coisas lindas para você. Tipo:
“Olha só!!! hoje meu cabelo brilha e minha boca está fresca, meus pés estão
tranqüilos, meu ventre está saudável, meu coração late forte, tenho fome, posso
andar, tenho vontade de olhar pela janela e respirar!!!”
Ninguém vai amá-la se você
mesma não se ama. O eterno clichê, bem pouco acreditado.
Na lua minguante muitas
mulheres entram no ciclo pré menstrual, enquanto outras entram no ciclo pôs menstruação.
Durante o ciclo da lua mal chamada de TPM, se produz o milagre da destruição do
ovulo, um impulso de destruição (de morte no sentido transformativo do termo) é
encarnado pelo corpo da mulher, um impulso que se fosse compreendido com consciência
e grandeza será vivido como o tempo de deixar morrer aquilo que tem que morrer,
deixar mudar aquilo que tem que mudar.
Contrario disso o impulso maravilhoso do ciclo pré menstrual na
loucura do dia a dia, na loucura da interpretação farmacêutica e medica, se converteu em um problema para as mulheres,
deixando-as irritadas, adoecidas,
"bravas", pois ao invés de mudar e fluir, se auto punem, se auto destroem, se
auto matam,. Usam o mistério da transmutação como destruição sobre elas mesmas e
sobre seu entorno.
A lua minguante nos
envia a mensagem de entrar no fundo, para entender, para fazer morrer o que tem
que morrer. Para usar a força da morte poética ao nosso favor, não em favor do
sistema. Encaminhar essa força faria de nós uns seres mais felizes com nosso
corpo, menos punitivas e mais amorosas com nós mesmas e por tanto com a terra.
Para terminar algumas
palavras da Clarissa Pinkola, que sempre tem coisas legais para dizer:
“A
questão não é de forma, mas de sensação. O seio em todos os formatos tem a
função de sentir e de amamentar. Ele amamenta?
Ele é sensível? Então é um seio bom...Já
os quadris são largos por um motivo. Dentro deles há um berço de marfim
acetinado para a nova vida. Os quadris da mulher são estabilizadores para o
corpo acima e abaixo deles. Eles são portais, são uma almofada opulenta,
suportes para as mãos no amor, lugar para as crianças se esconderem.
As
pernas foram feitas para nos levar, as vezes para nos empurrar. Elas são as
roldanas que nos ajudam á subir, são o anel que abraça o amado. Elas não podem
ser criticadas por ser muito isso o muito aquilo. Elas são o que são...A questão não está no tamanho, no formato ou na idade, nem mesmo no fato de ter tudo aos pares, pois algumas pessoas não tem. A questão está em saber se esse corpo sente, se ele tem um vinculo adequado com o prazer, com o coração, com a alma, com o mundo selvagem. Ele tem alegria, felicidade? Ele consegue ao seu modo se movimentar? Dançar gingar, balançar investir? É só isso o que importa”. (Clarissa Pinkola, Mulheres que correm com os lobos )
IMAGEM
URSULAV By Ursula, From deviantart.com
Querida Pilar, também acho que as mulheres perdem muita energia vital e muito de sua alegria estando insatisfeitas com seus corpos, oprimidas por padrões, pela cultura patriarcal, por religiões aprisionantes, por muitos tabus...
ResponderExcluirPorém, como tu muito bem disseste, nós mesmas acabamos por sustentar este sistema. Por isso, apesar de ser difícil, devemos buscar todos os dias cultivar o carinho e o amor por nossos corpos como eles são e relaxar na nossa pele. Acho linda a ideia de que viver deixa marcas, que cada ruguinha e fio de cabelo branco simbolizam mais um pedacinho de minha estada neste maravilhoso planeta.
Vai aí mais um trechinho da Clarissa. Adoro!
"Está errada a imagem vigente na nossa cultura do corpo exclusivamente como escultura.
O corpo não é de mármore. Não é essa a sua finalidade. A sua finalidade é a de proteger, conter, apoiar e atiçar o espírito e alma em seu interior, a de ser um repositório para as recordações, a de nos encher de sensações — ou seja, o supremo alimento da psique. É a de nos elevar e de nos impulsionar, de nos impregnar de sensações para provar que existimos, que estamos aqui, para nos dar uma ligação com a terra, para nos dar volume, peso.
O corpo é como um planeta. Ele é uma terra por si só. Como qualquer paisagem, ele é vulnerável ao excesso de construções, a ser retalhado em lotes, a se ver isolado, esgotado e alijado do seu poder. A mulher mais selvagem não será facilmente influenciada por tentativas de urbanização."
Beijos e caminhada florida,
Aline